Adão e Eva, “imagem e semelhança” de Deus (Gn 1–2) 1sj4l
Em Gn 1,1–2,4a, no primeiro relato da criação, Deus traz todas as coisas à existência em seis dias e, no sétimo, o sábado, Ele descansa, contempla e abençoa sua obra. Nessa narrativa a expressão “Deus disse” revela a força criadora de sua palavra. Contudo, a partir do terceiro dia, a locução “e Deus viu que era bom” serve como um refrão solene, sublinhando a ordem, bondade e beleza do universo, reflexos da perfeição divina. São Leão Magno reforça essa perspectiva, afirmando que a substância de todas as criaturas é boa, pois “Deus, criador de todas as coisas, não fez nada que não fosse bom”. Tal visão divina inspira iração, contemplação e louvor. 4c125n
No v. 26, Deus diz “façamos o homem à nossa imagem e semelhança”. No v. 27, é afirmado que “criou à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou, homem e mulher ele os criou”. Destaca-se, assim, o ser humano no plano da criação, pois só ele é imagem de Deus. Desse modo, cada pessoa humana, é “representante” do Deus vivo e capaz de se relacionar. Já o termo semelhança indica simetria entre duas realidades, como uma cópia. Deus não é comparável a nada, contudo, concedeu ao gênero humano carregar traços do divino. Sob essa ótica, a dignidade humana é patente no discurso da imagem de Deus:
O contexto bíblico autoriza compreender o ser-homem essencialmente como um ser capacitado a uma existência relacional. A vontade relacional de Deus fundamenta toda a relação humana com Deus, expressa justamente na intenção radical de Deus de formar o homem à sua imagem. A relação do homem com o mundo, sua condição de oposto à criação não humana, expressa na chamada ordem de domínio. O ordenamento do homem para as outras criaturas, como homem e mulher, existente em unidade corporal-espiritual.
O ser “imagem de Deus” é o elemento de divindade na humanidade, manifestada através do domínio sobre os seres e da participação na força criadora de Deus, atuando como co criador por meio da faculdade reprodutiva. Assim, homem e mulher, em sua mútua complementariedade, comunhão e fecundidade são expressão da natureza relacional de Deus. Ao receber a vida de Deus, eles acolhem também sua reciprocidade relacional para a comunhão e o amor gratuitos. Esse vínculo divino-humano torna-se, portanto, a raiz e o fundamento das relações entre as pessoas e com o mundo.
Aproximando-se do fim do sexto dia, após criar o homem e a mulher, Deus vê que “tudo o que tinha feito era muito bom”. A humanidade, dotada de inteligência e liberdade, torna-se o ápice do ato criativo divino, tal como exclama o salmista: “Tu o fizeste pouco menor do que um deus, coroando-o de glória e beleza. Para dominar as obras de tuas mãos, sob seus pés tudo colocaste” (Sl 8,5-6).
(3ª parte da sequência de reflexões sobre o tema “A Dignidade Humana sob o olhar de Deus”).