A VIVÊNCIA RELIGIOSA DA JUVENTUDE 3b5q6k
A reflexão sobre Igreja e juventude deve levar em consideração o contexto mais amplo em que se dá a experiência do sagrado e o pertencimento religioso juvenil. A juventude está de fato mais afastada das religiões na atualidade? Esta questão não ite respostas apressadas e absolutas, tanto pela diversidade que atravessa a juventude brasileira contemporânea, quanto pela dinâmica que vem imprimindo profundas transformações no campo religioso do Brasil nas últimas décadas. Também com relação à religião os jovens se diferenciam.
Os dados demográficos mais recentes sobre juventude e religião são da pesquisa Juventude, Juventudes: o que une e o que separa, realizada pela UNESCO em 2004[1], baseada em ampla amostra significativa dos jovens de 15 a 29 anos que viviam no Brasil naquele ano. Na época, a distribuição dos jovens pelas diferentes religiões segundo sua autodeclaração era: 66,2% católicos, 18,8% evangélicos, 1,4% espíritas, 1,4% outras religiões. Entre os demais, 4% assinalaram a opção “ateu, não tem religião”, e 7,9% a “religioso, mas não segue nenhuma religião” e 0,3% não deram opinião. Assim, o terceiro maior grupo é constituído por jovens sem religião, mas com crenças.
Os últimos dados disponíveis de recenseamento geral da população (2000) mostraram que os jovens se distribuíam pelas religiões de modo semelhante ao conjunto da população. A única diferença que merece destaque é que entre os jovens havia uma maior proporção de pessoas que se declararam sem religião (9,1%): o índice é 25% superior aos indivíduos sem religião no conjunto da população brasileira (7,3).
Entretanto isso não significa um crescimento mais acentuado do ateísmo entre jovens. Pesquisas recentes têm indicado que a grande maioria desses jovens sem religião tem crenças, busca uma proximidade com o sagrado, experimenta uma mística, muito embora não se sinta identificada com uma religião em particular.
Isso se deve a fenômenos como a desinstitucionalização religiosa (pessoas se desvinculam das religiões tradicionais e am a ter uma experiência do sagrado sem a mediação de instituições religiosas); o trânsito religioso (a peregrinação entre diferentes alternativas religiosas existentes no campo religioso); as adesões provisórias, a prática simultânea de mais de uma religião, a produção de sínteses pessoais, sincréticas, a partir de elementos disponíveis em diferentes sistemas de crenças.
Todos estes fenômenos, presentes na população em geral, são mais acentuados no segmento juvenil.
A busca de respostas para suas dúvidas e angústias existenciais, a abertura ao novo, a extrema curiosidade, a liberdade frente a exigências incompreensíveis, a crítica aguçada quando percebem nos líderes religiosos atitudes consideradas inadequadas são elementos que produzem vínculos mais tênues entre uma parcela da juventude e as instituições religiosas. É frequente encontrarmos jovens que em um curto período aram por diversas experiências religiosas. Muitos têm a atenção despertada para religiões de matriz oriental, ou para espiritualidades exóticas e esotéricas, associadas à dimensão terapêutica e do autoconhecimento.
Tudo isso coloca em xeque avaliações generalizadoras segundo as quais a juventude não teria interesse pelo universo religioso, nem firmeza no compromisso advindo dessa adesão. Também neste aspecto é possível perceber uma diferenciação no meio juvenil: alguns não estabelecem vínculos com as instituições religiosas; outros am simultaneamente diferentes sistemas religiosos para atender às suas necessidades de sentido; outros aderem com fervor a sistemas ou movimentos religiosos que exigem uma rígida observância de regras comportamentais; e alguns escolhem viver radicalmente os princípios da fé em comunidades constituídas em torno de uma identidade religiosa, não apenas no âmbito católico, mas também em religiões como o Santo Daime ou o Hare Krishna, ou em congregações e ordens religiosas católicas.
Isso vai em direção oposta à ideia corrente de que jovens teriam pudor de expor publicamente sua adesão religiosa. Ao contrário, existe uma tendência a dar visibilidade a marcas da religião no corpo (tatuagens), no vestuário, nos órios (anéis, cordões, braceletes, bandanas, bonés). Não se trata de uma experiência religiosa vivida apenas no âmbito privado.
Esses processos são vivenciados por pessoas de todas as idades, não apenas pelos jovens. Entretanto, estamos tratando de uma fase da vida em que se intensifica a experimentação que pode dar origem a escolhas existenciais importantes: a vivência da sexualidade, a busca de parceiros, a orientação sexual, a continuidade ou não dos estudos, a inserção profissional, os círculos de amizade, as adesões ideológicas, políticas, a adoção de determinados valores. A religião também é um campo de experimentação e de escolha para os jovens, mesmo que em todas estas áreas da vida as decisões não sejam definitivas e irreversíveis.
Também durante a juventude podem acontecer processos como a desvinculação da tradição religiosa em que o jovem foi socializado, rompendo com a religião dos pais, a conversão a outro sistema religioso, ou mesmo a readesão à religião de origem, não mais por herança familiar, mas por decisão própria, ando pelo crivo da consciência individual. Há mudanças no processo de transmissão da religião de uma geração a outra. Cada vez mais encontramos indivíduos com identidades religiosas diferentes numa mesma família, e cresce a influência de amigos que se tornam mediadores na aproximação de outras alternativas presentes no campo religioso.
A vivência da religião na Igreja Católica é experimentada por uma parcela da população jovem brasileira. Jovens participam das celebrações semanais, de grupos de jovens nas paróquias, comunidades, universidades, de grupos de iniciação cristã ou de catequese crismal, pertencem a pastorais, movimentos e associações religiosas, aderem às novas comunidades de vida e aliança, ou se preparam para a vida sacerdotal e religiosa.