O subjetivismo acirrado e o individualismo nos tornam superficiais colocando-nos contra tudo o que é comunitário. Preservar a memória de Cristo cabeça, no mundo de hoje, implica em preservar a Igreja que é seu corpo. Na Igreja há uma íntima conexão entre Palavra, Tradição e Magistério (DV 2). Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que a crise que se instaurou com a pandemia precisa se tornar ocasião de renovar a esperança e a ação pastoral baseada na sinodalidade, que foi recuperada pelo Concílio Vaticano II e é proposta, hoje em dia, a toda Igreja, pelo Papa Francisco. Sinodalidade que requer conversão no modo de ser Igreja, baseado na escuta de todos, na escuta do Espírito Santo, por parte de todos, e uma decidida conversão pastoral para uma fé vivida em comunidade (GS, Cap. II). 61a4r
Observamos que temos os instrumentos que nós mesmos fabricamos para dar uma fé sólida a nosso povo, mas não os aplicamos de fato. Temos muitos remédios, que nós mesmos fabricamos, mas não os aplicamos. Por que será? Precisamos continuar aprofundando os temas essenciais para a vida humana, tais como: a relação com Deus, o valor da pessoa e da vida humanas, a liberdade, o sofrimento etc., à luz das diversas disciplinas teológicas para dar respostas pastorais ao nosso tempo a partir da fé. É preciso recuperar o humanismo cristão baseado numa fé sólida, para responder aos desafios da atual situação.
Permitam-me fazer uma observação. Devemos nos perguntar se a evasão de fiéis de nossas comunidades, que vão para outras denominações, além de todos os motivos já elencados e sabidos, não é provocada, também, pela insegurança doutrinal, que leva cada um a crer no que convém, fazendo como que um “self-service” dos conteúdos da Fé. Constata-se aqui a urgência da Catequese de Iniciação à Vida Cristã, em todos os níveis. Este deve ser tema prioritário para nós.
Recordo que, certa vez, o Papa Francisco nos fez um alerta sobre o perigo do clericalismo, que sufoca a maturidade dos leigos na fé. Quase sempre não se leva em conta o “sensus fidei” (LG 12), pois todo fiel participa da compreensão e da transmissão da verdade revelada. Para o Papa, “o clericalismo reprimiu a maturação laical na América Latina”. Isto dificulta a transmissão da fé, a missionariedade da Igreja. Caracteriza-se aí a crise generativa, a dificuldade de transmitir a fé às novas gerações, algo que representa um grande desafio na atualidade. Por quê? Porque leigos malformados na fé tendem a reproduzir este clericalismo dito “laical”, não raro descambando para o fanatismo.
Enfim, somos chamados a empreender uma nova evangelização, com novos métodos, novo ardor e nova linguagem, porém sem mudar o conteúdo do depósito da fé. Toda nossa vida cristã é confiada “à regra de doutrina” (Rm 6,17).